16 de setembro de 2009

Conto

E agora?
por Guilherme Veríssimo

Podia sentir o gosto daquelas palavras que lhe entraram goela abaixo. Vinham recheadas de medo e aquecidas pela raiva que arrebenta uma veia na garganta.

Também tinha medo, raiva. Não lhe era alheio o mundo que o olhava ressabiado, que também lhe entregava provas... caminhos.

Sentira-se náufrago. Embriagado. Bebida exótica que queima e tira o norte. Filhote rebento de pernas bambas, criando forças para seguir.

O corpo respondera calmamente, por fora. Quizá um aumento de ritmia cadíaca o fizesse parecer um pouco mais corado, somente isso.

Petrificados e distantes, seus olhos fixos contiveram, dissimulados, a indignação de ser mal entendido.

Mal sabia seu pai o que lhe passava naquele momento. Esse era um daqueles instantes eternos, que nunca se esquece.

_ Tudo menos isso, lhe havia dito o pai, alheio a tudo que o filho representava.

Como se tivesse topado contra uma parede, recordando um incidente da infância, sentira um choque, e buscava descobrir onde havia se machucado.

Uma bala no cérebro - quente, fruto da fúria insana do progenitor, rápida e mortal, como o ataque de um felino selvagem.

De sentir o calor do predador, instinto de manter-se vivo, toma o casaco detrás da porta da sala de estar e empreende um rumo incerto pelas ruas da cidade vazia.
Postado por Gui Veríssimo às 00:53 |  
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